Memória feliz do Padre Luís Gonzaga Magalhães Uchoa

*Profa. Tânia Couto, ex-aluna do Pe. Luís Uchoa, recorda sua páscoa e relata a extraordinária pessoa do biblista e sua capacitação na Palavra de Deus

No dia 23 de junho celebramos a Páscoa do Padre Luís Gonzaga Magalhães Uchoa. Cedo foi levado de nosso convívio, com apenas 65 anos de idade, há, exatamente, 24 anos. Foi o único professor doutor pelo Pontifício Instituto Bíblico (Roma) que aqui exerceu o magistério. Lecionou todas as disciplinas da área de Teologia Bíblica, deixando em seus alunos a certeza de que estavam diante de um grande conhecedor da Sagrada Escritura que entrementes manifestava, mais ainda, o amor pela Palavra de Deus e o dom de ensinar. A esta causa dedicou sua vida.

Deixava em seus alunos a certeza de que estavam diante de um grande conhecedor da Sagrada Escritura que entrementes manifestava, mais ainda, o amor pela Palavra de Deus e o dom de ensinar. A esta causa dedicou sua vida.

Sendo um dos fundadores do então ICRE, junto ao Mons. Manfredo Ramos, formou toda geração de presbíteros desde 1964, não somente desta Arquidiocese, mas de todo o Regional Nordeste I que compreendia os Estados do Ceará, Piauí e Maranhão. Ao morrer ocupava a função de diretor da Biblioteca do Seminário da Prainha, a qual, merecidamente, recebe seu nome.

Muito mais que um homem sábio era um mestre da simplicidade e da humildade. Sua vida transbordava do anseio de fazer a Palavra conhecida e vivida.

Pe. Uchoa, como era carinhosamente chamado, era uma pessoa de muitos amigos. Muito mais que um homem sábio era um mestre da simplicidade e da humildade. Sua vida transbordava do anseio de fazer a Palavra conhecida e vivida. São estas raízes que ainda alimentam seus ex-alunos. Que neste dia a homenagem da FCF ao querido mestre, como incenso, suba ao coração da Trindade Santíssima como um TE DEUM.

Tânia Maria Couto Maia é Doutora em Teologia Bíblica e Professora de Teologia na Faculdade Católica de Fortaleza – FCF.

A Bíblia e a experiência com Deus: luz nos caminhos de ontem e de hoje

A aluna Kelviane Vieira* diz que este é o ponto alto da forte e inesquecível conexão do povo de Israel com Deus e o que gerou nesse povo uma experiência profunda e autêntica.

É oportuno ao ser humano que a Bíblia não seja apenas um livro de perguntas e respostas para as crises e questionamentos do mundo, como uma espécie de “google” compilado, isso a tornaria um livro comum a qualquer outro colocando-o em vista de respostas instantâneas e um entendimento relativista.

Além de ter sido escrito há muitos anos, fora do contexto em que vivemos, a finalidade do texto bíblico é gerar intimidade e proximidade com aqueles que com ele se relacionam e, certamente, a simples busca de respostas, com o intuito de sanar questionamentos não fomentaria tal relação.

A finalidade do texto bíblico é gerar intimidade e proximidade com aqueles que com ele se relacionam.

Por outro lado, sendo atualizado, o texto bíblico tem o poder, enquanto palavra divina, de iluminar a realidade humana em todo e qualquer contexto em que for utilizado, desde que intrínseco à busca do texto, esteja a experiência de fé.

Assim, se voltarmos o olhar acerca da história do povo da bíblia perceberemos a busca constante de Deus por seu povo, sempre firmada por um propósito: “Vós sereis o meu povo, e eu serei o vosso Deus” (Jr 30,22) uma relação de pertença e intimidade constituída na aliança entre Deus e o ser humano. Podemos dizer que esse seja o ponto alto da forte e inesquecível conexão do povo de Israel com Deus e o que gerou nesse povo uma experiência profunda e autêntica.

Relação de pertença entre Deus e o Homem: podemos dizer que esse seja o ponto alto da forte e inesquecível conexão do povo de Israel com Deus e o que gerou nesse povo uma experiência profunda e autêntica.

Fazendo uma comparação com o contexto em que vivemos, talvez possamos tomar como norte o Exílio vivido pelo povo da bíblia “o Exílio foi um desafio para o povo” (TILLESSE, 1984, p. 81) e diante deste desafio se fazia necessário compreender a presença e o zelo de Deus mesmo em meio àquele “castigo”.

É no Exílio que o povo da bíblia aprende uma nova maneira de viver sua fé, aprende a perceber que a presença de Deus não se restringe somente à terra, à Cidade Santa ou ao templo, mas está viva no povo cuja pertença a Deus fora estabelecida pela aliança. Deste modo, a aliança permanece viva “de uma maneira que o povo não entendia bem, mas que Deus, secretamente, lhe revela” (TILLESSE, 1986, p. 37).

Um período extremamente desafiador ao povo, mas profundamente fecundo onde este compreendeu sua real vocação e percebeu que sua identidade estava muito mais ligada a sua pertença a Deus do que a qualquer outra coisa.

Em meio aos nossos simbólicos exílios, nos cabe igualmente, percebermos novos modos de viver nossa fé, entendermos que mesmo neste contexto diferenciado do povo de Israel, Deus se manifesta e se faz presente dentro de cada ser humano.

É oportuno também refletirmos sobre o modo como nos relacionamos com Deus, se apenas interessados em gestos e respostas açucaradas ou se estamos dispostos a assumir de fato, uma aliança que não nos isenta das crises internas ou externas que envolvem nossa realidade, mas que nos garante a certeza de que firmados em um laço concreto com Deus, não daremos espaço ao relativismo ou ao comodismo.

Bibliografia

TILESSE, Caetano Minette de. Revista Bíblica Brasileira. Ano I, Nº III. Fortaleza, Nova Jerusalém, 1984.

TILESSE, Caetano Minette de.Nova Jerusalém, Eclesiologia: Livro Primeiro: Reino de Deus. Fortaleza: Editora Nova Jerusalém, 1986.

*Kelviane Pontes Vieira, Aluna do Bacharelado em Teologia, 1º. Ano, Atividade da Disciplina de Introdução à Sagrada Escritura, Profa. Dra. Aíla Pinheiro.
Fale com a Autora: kelnjlj@gmail.com

“Ai de vós escribas e fariseus… que impõem fardos pesados e difíceis de suportar” (Mt 23,4)

O aluno Deusimar* apresenta alguns paralelos entre as palavras do Papa Francisco e os “Ais” de Jesus contra escribas e fariseus em Mt 23.

Os “Ais” de Jesus contra os escribas e fariseus (Mt 23) encontram eco na homilia do Papa Francisco durante a missa no dia 15 de maio de 2020. Dizia o Papa que nos tempos atuais “vimos algumas organizações apostólicas que pareciam propriamente bem organizadas e que trabalhavam bem, mas todos rígidos, todos iguais um ao outro, e depois soubemos da corrupção que havia dentro, inclusive nos fundadores”.

O Papa não fica simplesmente na percepção a respeito da organização e do bom desempenho de certas instituições católicas, mas aprofunda sua visão – assim como Jesus – mostrando que estas permanecem na superficialidade das aparências, no cumprimento de preceitos e regras –como se fossem, mais ou menos, rituais mágicos – que não apresentam um significado que vá além da epiderme. A grande questão é que esse tipo de vivência acaba por impedir outros de seguirem na liberdade de espírito e no ditame das consciências. Isso acontece com frequência na Igreja, sejam dos mais rígidos, sejam dos mais laxistas. Ambos parecem querer impor seus conceitos de moral aos outros, e acredito que essa não é a nossa função de futuros pastores e nem mesmo de cristãos.

É nisso que se diferencia a radicalidade, no sentido próprio da palavra (“radix”, raiz, profundo) do fanatismo. Uma “pessoa radical”, que tem raízes profundas, ou melhor, que deixou o evangelho aprofundar nas bases mais elementares da sua existência vive e testemunha a mensagem de Cristo e isso atrai, naturalmente, outras pessoas.

Um fanático procura que os outros vivam aquilo que ele achaque deve ser vivido, mas ele mesmo não se esforça viver aquilo que exige dos outros. Esse caminho pode acabar por “fechar as portas do céu” para algumas pessoas que não se enquadram em determinados padrões sociais – e isso acaba por impedir que elas, livremente se entreguem ao Evangelho – e possam ser grandes santos. “Onde abundou o pecado, superabunda a graça de Deus” (Rm 5, 20).

Nenhum preconceito encontra-se apoiado na Palavra de Deus. Isso acaba por impedir o acolhimento da pessoa na comunidade eclesial e impede o acolhimento da Palavra por parte dessa pessoa. Esta acaba por identificar a Palavra com seu opressor, rejeitando-a.

Isso me faz lembrar também das palavras do Papa quando se referia à acolhida – especificamente falava das pessoas com tatuagem, jovens com cabelo colorido etc. Quantas vezes as pessoas tentam dar uma legitimação religiosa aos seus preconceitos sociais. Preconceitos sociais sim, pois nenhum preconceito encontra-se apoiado na Palavra de Deus. Isso acaba por impedir o acolhimento da pessoa na comunidade eclesial e impede o acolhimento da Palavra por parte dessa pessoa. Esta acaba por identificar a Palavra com seu opressor, rejeitando-a.

No começo de seu pontificado, no segundo natal celebrado para a Cúria Romana, em 2014, o Papa Francisco advertiu os membros da Cúria contra 15 doenças espirituais que valem a pena serem relembradas. Especificamente, gostaria de citar a Dura Mentalidade, a Rivalidade e a Vanglória, o Terrorismo das Fofocas, a Cara de Enterro e os Círculos Fechados que parecem se adequar também nos “Ais” pronunciados por Jesus contra os Escribas e  Fariseus e que são facetas desse rigorismo eclesial que muitos tentam impor à Igreja. Para contrapor a esse tipo de mentalidade, na homilia desse 15 de maio, o papa propõe a gratuidade e a gratidão, sair da perturbação à alegria! Faz ecoar uma palavra que ele tanto repetiu na Evangelii Gaudium: “Não deixemos que nos roubem a alegria” (EG 83), nada, nem ninguém… Nem os legalistas, nem os acusadores, nem os caluniadores, nem os fofoqueiros, nem os mentirosos, nem os preguiçosos, nem os clericalistas…

“Não deixemos que nos roubem a alegria” (EG 83), nada, nem ninguém… Nem os legalistas, nem os acusadores, nem os caluniadores, nem os fofoqueiros, nem os mentirosos, nem os preguiçosos, nem os clericalistas…

Evangelii Gaudium, Papa Francisco

Apoiados numa esperança que não decepciona, sigamos em frente!

(*Francisco Deusimar Andrade Albuquerque, Bacharelando em Teologia, 3º Ano, atividade sobre o Evangelho segundo Mateus, Profa. Dra. Aíla Pinheiro).